“Vocês acharam que eu não ia rebolar a minha bunda hoje”, toca a sirene e o embalo contagiante do funk invade um dos eventos mais importantes da música do mundo. No comando, Larissa, mais conhecida como Anitta, vestida de vermelho, já aqui um ato político, e o favela invadiu o VMA. Para encerrar, a cantora leva o prêmio inédito para o Brasil de melhor música latina com Envolver. O feito da gata não termina aí, a sua performance foi eleita pela Billboard, a terceira melhor da noite.
Vestida de Schiaparelli e de vermelho, ela adentra nitidamente emocionada para pegar a estatueta e fala da importância para periferia, para as mulheres periféricas a conquista de seu prêmio. “Meu ritmo era considerado crime” diz ela no discurso e finalizou dizendo que de onde ela vem sonhar não é tão simples assim. No mesmo evento, se apresentava o grupo Maneskin, rock and roll, descontruído e tal, Damiano Davide, o vocalista da banda rebola sua bunda para o mundo com a sua tanga fio dental. Pleníssimo!
“Anitta venceu pela bunda” Na explosão de vermos a mina de Honório Gurgel vencer, veio a avalanche não só de desumanização e deslegitimação de seu talento, mas uma onda de misoginia e elitismo invadiu os comentários das redes sociais e mesas de bares. No mesmo momento que Damiano, balançava a sua bunda feliz e contente, Victoria Angelis teve sua performance censurada por mostrar os seios. Put@! Ninguém questiona o talento do vocalista do Maneskin pela sua bunda rebolante, mas censuram a parceira de banda por um seio a mostra e reduzem Anitta a uma bunda. É como se nosso corpo fosse nosso calvário, hiper sexualizado. Amores, a culpa não é dela, não é da Victoria, nunca foi da Madonna ou da Beyonce, ou da Gaga! O patriarcado sexualiza os nossos corpos desde que o mundo é mundo. Não temos a liberdade para podermos mostrar e fazer o que quisermos com ele, ainda.
Para a sociedade patriarcal essas mulheres erram por se mostrarem donas de si mesmas, intimidam. Nós mulheres, por vezes, as criticamos por termos o chip implantado no nosso cérebro, no amago do inconsciente onde somos umas rivais das outras. Anitta não é a primeira e nem será a última a ser julgada por se mostrar uma mulher desejante e segura de si. Madonna por exemplo, em toda sua carreira, viu uma avalanche de ódio sobre si e sobre o seu trabalho. Em discurso feito para Billboard, Madonna dizia que seu maior pecado era ser mulher, pois Prince fazia tudo o que ela fazia e não passou pelos mesmos julgamentos. Bruxa! Sem talento! Mudou-se talvez a cara dos tempos, mas infelizmente “ainda somos os mesmos e vivemos como nossos pais”.
Anitta obrigada por levar o funk brasileiro para o mundo, por mostrar um Brasil longe das amarras que nos prendem hoje que dança, é livre. Obrigada por ser essa mulher phoda, que sabe navegar nos mares mais turbulentos e vencer, que sabe usar da moda para mandar sua mensagem política, sem medo e ainda por cima de Couture, o símbolo máximo do luxo num corpo periférico. A sua existência é uma vitória para todas nós, o seu prêmio é um respiro e um alento em tempos difíceis para nós mulheres. Eu não vim do gueto, não ouso imaginar o que você passou e tantas outras passam todos os dias, mas sei que uma vitória sua mexe toda estrutura da sociedade. E ela rebolou a bunda sim hoje, porque ela quis, pode e tem talento, muito talento. Buongiornissimo.